ARTIGO ORIGINAL
Obesidade materna em gestacöes de alto risco e complicares
■ m ■ r ■
infecciosas no puerperio
Letícia Vieira de Paiva1, Roseli Mieko Yamamoto Nomura2, Maria Carolina Gonijalves Dias3, Marcelo Zugaib4
1Nutricionista; Aluna de Pós-graduagao da USP, Sao Paulo, SP, Brasil
2Livre-docente; Professora-associada da Universidade de Sao Paulo (USP), Sao Paulo, SP, Brasil
3Mestre em Nutrigao Clínica; Nutricionista do Instituto Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, Sao Paulo, SP, Brasil 4Professor Titular da Faculdade de Medicina da USP, Sao Paulo, SP, Brasil
Trabalho realizado na Disciplina de Obstetricia do Departamento de Obstetricia e Ginecologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Sao Paulo e na Divisao de Nutrigao e Dietética/Grupo de Nutrologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de Sao Paulo, Sao Paulo, SP, Brasil
Artigo recebido: 21/09/2011 Aceito para publicado: 19/02/2012
Suporte financeiro:
Bolsa de mestrado para a aluna Leticia Vieira de Paiva concedida pela Fundagao de Amparo a Pesquisa do Estado de Sao Paulo (FAPESP), Brasil
Correspondencia para:
Roseli Mieko Yamamoto Nomura Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 255 10° andar, sala 10037 Sao Paulo - SP, Brasil CEP: 05403-000 roseli.nomura@hotmail.com
Conflito de interesse: Nao há.
Resumo
Objetivo: Analisar a associa^ao entre a obesidade materna e complicares infecciosas do puer-pério em gestares de alto risco. Métodos: Estudo prospectivo de ago/2009 a ago/2010, com os seguintes critérios de inclusao: puérperas até o 5° dia; idade >18 anos; gesta^ao de alto risco; feto único e vivo no inicio do trabalho de parto; parto na instituido; peso materno aferido no dia do parto. O estado nutricional no final da gesta^ao foi avaliado pelo índice de massa corporal (IMC), aplicando-se a curva de Atalah et al. (1997), e as pacientes foram classificadas em: baixo peso, adequado, sobrepeso e obesidade. As complicares do puerpério, investigadas durante o periodo de internado e 30 dias após a alta, foram: infec^ao e/ou secre^ao em ferida cirúrgi-ca, infec^ao urinária, infec^ao puerperal, febre, hospitalizado, uso de antibióticos e morbidade composta (pelo menos uma das complicares citadas). Resultados: Foram incluidas 374 puérperas classificadas pelo IMC final em: baixo peso (n = 54, 14,4%); adequado (n = 126, 33,7%); sobrepeso (n = 105, 28,1%) e obesidade (n = 89, 23,8%). A obesidade materna apresentou as-socia^ao significativa com as seguintes complicares do puerpério: infec^ao de ferida cirúrgica (16,7%, p = 0,042), infecto urinária (9,0%, p = 0,004), uso de antibiótico (12,3%, p < 0,001) e morbidade composta (25,6%, p = 0,016). Aplicando-se o modelo de regressao logística verificou-se que a obesidade no final da gestado é variável independente na predi^ao da morbidade composta (OR: 2,09; IC 95%: 1,15-3,80, p = 0,015). Conclusao: A obesidade materna no final da gravidez, em pacientes de alto risco, está associada de forma independente a ocorréncia de complicares infecciosas no puerpério, demonstrando a necessidade de acompanhamento mais eficiente de ganho de peso materno nessas gesta^Ses.
Unitermos: Estado nutricional; obesidade; gravidez; periodo pós-parto; gravidez de alto risco; infec^ao puerperal
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Summary
Maternal obesity in high-risk pregnancies and postpartum infectious complications
Objective: To analyze the association between maternal obesity and postnatal infectious complications in high-risk pregnancies. Methods: Prospective study from August 2009 through August 2010 with the following inclusion criteria: women up to the 5th postpartum day; age > 18 years; high-risk pregnancy; singleton pregnancy with live fetus at labor onset; delivery at the institution; maternal weight measured on day of delivery. The nutritional status in late pregnancy was assessed by the body mass index (BMI), with the application of the Atalah et al. curve. Patients were graded as underweight, adequate weight, overweight, or obese. Postpartum complications investigated during the hospital stay and 30 days post-discharge were: surgical wound infection and/or secretion, urinary infection, postpartum infection, fever, hospitalization, antibiotic use, and composite morbidity (at least one of the complications mentioned). Results: 374 puerperal women were included, graded according to the final BMI as: underweight (n = 54, 14.4%); adequate weight (n = 126, 33.7%); overweight (n = 105, 28.1%); and obese (n = 89, 23.8%). Maternal obesity was shown to have a significant association with the following postpartum complications: surgical wound infection (16.7%, p = 0.042), urinary infection (9.0%, p = 0.004), antibiotic use (12.3%, p < 0.001), and composite morbidity (25.6%, p = 0.016). By applying the logistic regression model, obesity in late pregnancy was found to be an independent variable regardless of the composite morbidity predicted (OR: 2.09; 95% CI: 1.15-3.80, p = 0.015). Conclusion: Maternal obesity during late pregnancy in high-risk patients is independently associated with postpartum infectious complications, which demonstrates the need for a closer follow-up of maternal weight gain in these pregnancies.
Keywords: Nutritional status; obesity; pregnancy; postpartum period; high-risk pregnancy; puerperal infection.
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Introduqao
O estado nutricional é resultado do equilibrio entre o consumo de nutrientes e o gasto energético do organismo para suprir as necessidades diárias. Sua investigado é baseada na medido de parámetros físicos e na composi^ao corporal global. Os parámetros adotados para a vigiláncia nutricional em gestantes sao: índice de massa corporal (IMC) e ganho de peso gestacional. As medidas de peso e estatura sao as mais utilizadas e o IMC é indicador fundamental para o diagnóstico do estado nutricional materno1,2. Esse índice permite identificar gestantes em risco nutricional, principalmente a obesidade materna, e, nessa condi^ao, recomenda-se a orientado nutricional, visando a promodo da saúde materna, proporcionando melhores condi-^5es para o parto e adequado peso do recém-nascido2.
Em gestantes obesas, as complicares no puerpério sao frequentes, principalmente as infecciosas. Alguns estudos demonstram que, independentemente da via de parto, é mais frequente a ocorréncia de endometrites, infecdo da ferida cirúrgica, lacerares da episiotomia, hemorragia pós-parto e tempo cirúrgico mais prolongado3-5. Esses aspectos sao preocupantes, tendo em vista que no Brasil o excesso de peso representa o problema nutricional de maior prevaléncia, pontuando de 25 a 30% das gestares6-8, e a incidéncia da obesidade está aumentando entre as mulheres em idade fértil, segundo o Institute of Medicine (IOM) - órgao governamental que faz parte da Academia Nacional de Ciéncias dos EUA9. Além disso, a obesidade, por si só, torna de alto risco a gestado pela reconhecida associa^ao com pré-eclámpsia, diabetes mel-litus, macrossomia fetal, tromboembolismo venoso10-11, aumento da incidéncia de cesáreas12-14, distocias e complicares puerperais15, influenciando o prognóstico da gravidez16-17. Entretanto, ainda nao sao conhecidos os desfechos infecciosos do puerpério de mulheres obesas associadas a outras comorbidades. Para esclarecer essa lacuna, o presente estudo foi conduzido em gestares de alto risco, com o objetivo de verificar a influéncia do estado nutricional materno no final da gravidez e a ocorréncia de complica-^5es no puerpério.
Métodos
Este estudo observacional prospectivo foi desenvolvido no período de agosto de 2009 a agosto de 2010. O protocolo de pesquisa e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foram aprovados pelo Comité de Ética em Pesquisa da instituido, sob o n° 1233/07.
Foram convidadas a participar da pesquisa 472 mulhe-res cujo parto foi realizado em hospital universitário de atendimento terciário adotando-se os seguintes critérios de inclusao: puérperas até o 5° dia cuja gestado foi caracterizada como de alto risco; idade materna maior ou igual a 18 anos; feto único e vivo no inicio do trabalho de parto; parto na instituido; peso materno aferido no dia do parto,
mulheres que concordaram em participar do estudo. Fo-ram caracterizadas como de alto risco as que apresentaram alguma intercorréncia clínica ou obstétrica complicando a gravidez. Os critérios de exclusao adotados foram: nao obten^ao de contato telefónico após a alta hospitalar e pre-juízo na capacidade de compreender a entrevista.
Os dados foram coletados por meio de entrevista aplicada pela pesquisadora executante, utilizando-se protocolo previamente elaborado, contendo: dados da paciente, dados da internado, hábitos/vícios, intercorréncias obstétricas, diagnósticos clínicos, dados do parto e do recém-nascido. Foram pesquisadas nos prontuários da paciente: as informales referentes as intercorréncias clínicas e/ou obstétricas; o tipo de parto (normal, fórcipe e cesárea); e as complicares no puerpério (infecdo e/ou secredo de ferida cirúrgica, infecdo urinária, infecdo puerperal, fe-bre, hospitalizado, mastite, necessidade de antibioticotera-pia). As complicares puerperais ocorridas até o 30° dia de puerpério também foram investigadas por meio de contato telefónico, efetuado pela pesquisadora, após a alta hospita-lar. Foi considerada morbidade composta a ocorréncia de uma ou mais complicaos maternas no período puerperal.
O estado nutricional materno no final da gravidez foi avaliado pelo índice de massa corporal (IMC), tendo como base altura e peso corporal da paciente, ambos afe-ridos no dia do parto. Foram utilizados os valores limites do IMC por semana gestacional da curva de Atalah et al.ls para classificado do estado nutricional materno em: baixo peso, adequado, sobrepeso e obesidade.
A idade gestacional foi calculada a partir da data da última menstruado (DUM), quando era compatível com a idade gestacional estimada pela ultrassonografia realizada, no máximo, até a 20a semana de gestado. Nos casos em que nao foi observada tal concordáncia, a idade gestacional foi calculada pelos dados da primeira ultrassonografia. O peso do recém-nascido, em gramas, aferido na sala de parto, foi comparado a curva de normalidade de Alexander et al.19, de forma que foram classificados como peque-nos para a idade gestacional (PIG) aqueles com o peso inferior ao 10° percentil da faixa correspondente, adequados (AIG) quando entre os percentis 10 e 90, e grandes (GIG) quando acima do percentil 90.
Para o cálculo do tamanho amostral foi utilizado o programa MedCalc versao 11.5.1.0. Pelo fato de nao exis-tirem estudos prévios com gestantes de alto risco, foram utilizadas as propones de complicares infecciosas pós-parto relatadas no estudo de Bianco et al.3 em mulheres obesas e nao obesas. Considerando-se erro tipo I (alfa) de 0,05 e erro tipo II (beta) de 0,10, foi calculado o tamanho amostral necessário para a presente pesquisa de 340 casos. Foram incluídas na presente pesquisa 408 puérperas; entretanto, desse total, trés apresentaram prejuízo na ca-pacidade de compreensao da entrevista e nao foi possível obter contato telefónico com 31 pacientes após o parto.
Obesidade materna em gestaçoes de alto risco e complicaçoes infecciosas no puerpério
Dessa forma, a populaçâo total do estudo foi constituida por 374 puérperas classificadas pelo IMC final em: bai-xo peso (n = 54, 14,4%); adequado (n = 126, 33,7%); sobrepeso (n = 105, 28,1%) e obesidade (n = 89, 23,8%). As características da populaçâo, nos grupos analisados, es-tâo apresentadas na Tabela 1.
Os resultados foram analisados com o emprego do programa MedCalc (MedCalc software bvba, versâo 11.5.1.0). As variáveis categóricas foram analisadas descritivamen-te, calculando-se frequências absolutas e relativas. Para análise das variáveis continuas os resultados foram ex-pressos em médias e desvios-padrâo. Para comparaçâo entre proporçôes foi aplicado o teste de Qui-quadrado, e, quando pertinente, o teste exato de Fisher. Foi utilizado o
teste ANOVA para comparado das médias entre os grupos, nas variáveis com distribuido normal, e o teste de Kruskal-Wallis para as variáveis de distribuido nao normal. Foi utilizado o modelo de regressao logística múltipla para identificado das variáveis independentes associadas ao desfecho. Foi adotado como nível de significáncia o valor 0,05 (alfa = 5%). Com isso, níveis descritivos (p) inferiores a esse valor serao considerados significantes (p < 0,05).
Resultados
A análise dos fatores associados ao estado nutricional materno no final da gravidez (Tabela 1) demonstrou pro-pordo significativamente maior de gestantes nulíparas no grupo com estado nutricional classificado como baixo
Tabela 1 - Características maternas nas gestaçôes de alto risco de acordo com a classificaçâo do estado nutricional no final
da gestaçâo
Estado nutricional materno final
Características B/A (n = 180) S (n = 105) O (n = 89) P
Idade média (DP) 29,2 (6,7) 29,9 (5,8) 30,0 (6,2) 0,559
Cor branca, n (%) 85 (47,2) 47 (45,6) 53 (59,5) 0,282
Nulíparas, n (%) 80 (44,4) 32 (30,5) 23 (25,8) 0,004
Cesárea anterior, n (%) 48 (26,7) 38 (36,2) 37 (41,6) 0,035
Tabagismo, n (%) 30 (16,7) 17 (16,2) 7 (7,9) 0,129
Intercorrencias clínicas e/ou obstétricas, n (%)
HA 37 (20,5) 38 (36,2) 55 (61,8) < 0,001
Diabetes 17 (9,4) 24 (22,8) 18 (20,2) 0,005
Cardiopatia 39 (21,7) 13 (12,4) 8 (8,9) 0,014
RCF 35 (19,4) 14 (13,3) 6 (6,7) 0,019
Infecgoes 20 (11,1) 9 (8,6) 6 (6,7) 0,485
RPM 26 (14,4) 8 (7,6) 7 (7,9) 0,116
Colagenoses 12 (6,7) 6 (5,7) 5 (5,6) 0,923
MF fetal 17 (9,4) 5 (4,8) 4 (4,5) 0,188
Outros 17 (9,4) 16 (15,2) 7 (7,9) 0,191
Tipo de parto, n (%)
Cesárea 123 (68,3) 80 (76,2) 70 (78,6)
Normal 37 (20,5) 20 (19,0) 14 (15,7) 0,201
Fórcipe 20 (11,1) 5 (4,8) 5 (5,6)
IG no parto, média (DP) 37,2 (2,8) 37,6 (2,5) 37,5 (2,9) 0,210
Peso do RN, média (DP) 2676 (706) 2902 (691) 3070 (803) < 0,001
Classificagao do peso do RN, n (%)
PIG 56 (31,1) 24 (22,8) 11 (12,3)
AIG 121 (67,2) 78 (74,3) 71 (79,8) 0,002
GIG 3 (1,7) 3 (2,8) 7 (7,9)
DP, desvio-padrao; B/A, baixo peso ou adequado; S, sobrepeso; O, obesidade; HA, hipertensao arterial; RCF, restrigao do crescimento fetal; RPM, ruptura prematura de membrana; MF fetal, malformagao fetal; IG, idade gestacional; RN, recém-nascido; PIG, pequeño para a idade gestacional; AIG, adequado para a idade gestacional; GIG, grande para a idade gestacional.
peso e adequado (p = 0,004), e frequéncia significativamente maior de cesárea anterior no grupo com obesidade (p = 0,035). Com rela^ao a incidéncia de intercorréncias clínicas constatou-se maior frequéncia de hipertensao arterial de obesas e de diabetes nos grupos com sobrepeso e obesidade (p < 0,001 e p = 0,005). Quanto aos diagnósticos de cardiopatia e restribo do crescimento fetal, essas intercorréncias foram mais frequentes no grupo com bai-xo peso e adequado (p = 0,014 e p = 0,019). Esse grupo também apresentou média de peso do recém-nascido significativamente menor (p < 0,001) que os demais grupos. Observou-se ainda maior propor^ao de recém-nascidos PIG e menor proporqao de AIG (p = 0,002, Tabela 1).
Na pesquisa das complicares maternas no puerpério (Tabela 2), observou-se que a obesidade no final da gravidez associou-se significativamente aos seguintes resultados: infecqao de ferida cirúrgica (p = 0,042), infec^ao urinária (p = 0,004), necessidade de antibioticoterapia (p < 0,001) e morbidade composta (p = 0,016).
Com o objetivo de verificar quais fatores associaram-se de forma independente a ocorréncia da morbidade materna composta, foi utilizado o modelo de regressao logística com eliminado retrógrada de fatores. As variáveis de con-fusao incluidas no modelo foram: classificaqao do estado nutricional materno final, hipertensao arterial, diabetes, classifica^ao do peso do recém-nascido e tipo de parto. A obesidade materna no final da gesta^ao foi independen-temente associada a morbidade composta no puerpério, com OR de 2,09 (IC 95% 1,15-3,80, p = 0,015, Tabela 3).
Discussáo
Esta pesquisa constatou que, em gestantes de alto risco, a obesidade no final da gravidez é fator independen-te para complicares no puerpério. Essa associa^ao tem sido apontada em estudos populacionais3-5,20, porém nao
há trabalhos focados em gestantes de alto risco, quando comorbidades ou outros fatores podem contribuir para a ocorréncia desses desfechos.
No presente estudo, a obesidade materna pela classi-ficaqao do estado nutricional final apresentou associa^ao com intercorréncias clínicas como hipertensao, diabetes e cardiopatia. Apesar de essas patologias poderem poten-cialmente interferir na ocorréncia de complicares do parto, os resultados obtidos demonstraram que a obesidade é o fator relevante e independente. Nesse hospital universi-tário com elevada taxa de cesáreas21, é essencial minimizar fatores que contribuam para a ocorréncia de complicares.
O aumento das taxas de cesárea no país é aspecto importante no manejo das gesta^ñes de alto risco. Qualquer fator que favoreqa maior morbidade pós-operatória deve ser ponderado no momento da decisao pela via de parto. Sebire et al.5, em estudo populacional de coorte retrospectivo, relatam 10,9% de obesidade materna, avaliada pelo IMC pré-gestacional, com aumento do risco para eventos como: hemorragia pós-parto (OR: 1,39; IC 95%:1,32-1,46), infecto do trato genital (OR:1,30; IC 95%:1,07-1,56), infecto urinária (OR: 1,39; IC 95%:1,18-1,63) e infecto de parede (OR: 2,24; IC 95%:1,91-2,64). Nao existem estudos em gestantes de alto risco que abordem a influéncia do peso materno nas complicares do parto. Além das diversas comorbidades que podem estar associadas, a obe-sidade revela-se fator importante na determinado dessas complicares. A presente casuística, que avaliou o IMC final em gesta^5es de alto risco, também mostrou asso-cia^ao entre a obesidade e as complicares infecciosas no pós-parto, demonstrando a necessidade de melhor orien-ta^ao pré-concepcional, para que as mulheres engravidem em melhores condi^ñes nutricionais, bem como a adoqao de medidas preventivas para que nao mudem a classifica-^ao nutricional com o transcorrer da gravidez.
Tabela 2 - ComplicagSes no puerpério de gestagSes de alto risco de acordo com a classificagao do estado nutricional no final da gestagao
Estado nutricional materno final
Complicacao no puerpério B/A (n = 181) S (n = 103) O (n = 90) P
Infecgao de cicatriz (%) 14 (7,8) 8 (7,6) 15 (16,8) 0,042
Secregao na cicatriz 5 (2,8) 0 (0) 5 (5,6) 0,054
Infecgao urinária 4 (2,2) 1 (1) 8 (9,0) 0,004
Infecgao puerperal 2 (1,1) 1 (1) 0 (0) 0,617
Febre 13 (7,2) 4 (3,8) 11 (12,3) 0,077
Hospitalizado 3 (1,7) 1 (1) 3 (3,4) 0,446
Mastite 4 (2,2) 1 (1) 0 (0) 0,302
Necessidade de antibioticoterapia 7 (3,9) 0 (0) 11 (12,3) < 0,001
Morbidade composta 26 (14,4) 12 (11,4) 23 (25,8) 0,016
B/A, baixo peso ou adequado; S, sobrepeso; O, obesidade.
Obesidade materna em gestaqoes de alto risco e complicares infecciosas no puerperio
Tabela 3 - Regressao logística múltipla com eliminagao retrógrada de fatores independentes associados a morbidade materna no puerpério
Variável Odds ratio Intervalo de confianza 95% p
Obesidade 2,09 1,15-3,80 0,015
Parto normal 0,43 0,17-1,04 0,061
Recém-nascido GIG 2,78 0,85-9,06 0,090 GIG, grande para a idade gestacional.
Outro aspecto relevante diz respeito as mulheres que migram da eutrofia para o sobrepeso ou obesidade. O ga-nho excessivo de peso materno deve ser alertado para a ocorréncia de complicares no parto e puerpério, principalmente quando as mulheres atingem a faixa que caracteriza a obesidade. O controle do ganho de peso é importante tanto para a saúde materna e fetal, quanto para o resultado do parto7,22. Seligman et al.23, em estudo nacional com gestantes de populado geral, verificam que a obesidade pré-gestacional e o ganho de peso excessivo aumentam de forma independente o risco de cesárea e de resultados adversos durante o parto, no entanto nao analisam o IMC materno final da gravidez.
Mantakas et al.20 observam que o maior IMC implica maior risco para infec^ao puerperal em gestantes submeti-das a cesarianas (OR: 2,41; IC 95%: 0,86-9,88). O presente estudo nao mostrou associado entre a obesidade materna e o tipo de parto, pois a cesárea foi muito prevalente em todos os grupos analisados. Isso ocorreu, muito provavel-mente, pelo fato deste estudo abordar especificamente gestantes de alto risco, nas quais as comorbidades clínicas e/ ou obstétricas acabam por aumentar a taxa de cesáreas. No entanto, na análise multivariada, o parto normal perma-neceu no modelo de regressao logística, sugerindo exercer efeito protetor para a morbidade composta, apesar de nao atingir significancia estatística.
A própria obesidade materna predispoe mulheres a complicado es gestacionais e aumenta a necessidade de interven^oes obstétricas. Weiss et al.24 observam maior chance de hipertensao gestacional em obesas quan-do comparadas aos grupos com sobrepeso e baixo peso (OR: 2,2; IC 95%: 2,1-2,6/ OR: 1,5; IC 95%: 1,4-1,7/ OR: 0,7; IC 95%: 0,6-0,8), respectivamente.
A propor^ao de obesas em gestantes de alto risco foi de 24%, e a morbidade composta, que significou a ocorrén-cia de pelo menos um dos eventos mórbidos investigados, ocorreu em 1/4 delas. Qualquer morbidade pós-opera-tória compromete o bem-estar materno, podendo trazer prejuízos no relacionamento entre mae e recém-nascido. Por vezes, a necessidade do uso de antibióticos pode tra-zer preocupares para o aleitamento, até que se resolva a complicado que acometeu a mae.
As complicares fetais mais comuns associadas a obesidade materna sao óbito fetal, doenqas genéticas e ma-crossomia12,22,25,26. O presente estudo também verificou
maior média de peso do recém-nascido e maior propongo de GIG, nas gestantes classificadas como obesas pelo IMC final. Entretanto, apesar da variável recém-nascido GIG permanecer no modelo final da regressáo logística, náo atingiu significáncia estatística para a morbidade materna composta.
As limitares deste estudo referem-se á impossibili-dade de se obterem dados do acompanhamento do ganho de peso durante a gestado, para comparar os diferentes desfechos maternos e complicares do parto. O estudo de subgrupos com comorbidades específicas poderá identificar outros fatores associados ás complicares pós-parto em trabalhos futuros. Além disso, as informares sobre as complicares pós-parto foram obtidas por contato telefónico, e casos foram excluidos pela impossibilidade de contato, o que pode ter contribuido para algum viés.
Conclusäo
Em conclusáo, este estudo permitiu constatar que, em ges-ta^oes de alto risco, a obesidade materna final está associa-da de forma independente á ocorréncia de complicares infecciosas no puerpério, tais como: infec^áo de ferida cirúrgica, infecdo urinária, necessidade de antibioticote-rapia, bem como á morbidade composta. Isso demonstra a necessidade de acompanhamento mais eficiente de ganho de peso materno nessas gesta^öes, com o objetivo de minimizar as complicares no puerpério.
Agradecimentos
A Fundado de Amparo á Pesquisa do Estado de Sáo Paulo (FAPESP) pelo auxilio recebido (bolsa de mestrado).
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